Na banguela


Antes de sair do Chile pela última vez passamos por um posto de gasolina, não andamos um quilômetro e resolvemos que a melhor ideia seria voltar e garantir uns litros a mais antes de passar a fronteira. Então, fomos lá e abastecemos um pouco, tão pouco que até o frentista estranhou. O gps indicava que não faltava tanto para o próximo posto, do outro lado da fronteira.



Começamos a subir, subir e subimos mais um pouco. Paramos para almoçar no que parecia uma parada de caminhões, comemos, descansamos e descansamos o carro também. Nos preparamos para seguir adiante na subida sem fim. Quando vi do que se tratava o caminho dos "los caracoles", cheguei a duvidar da Matilda, mas ela superou todas as expectativas e enfrentou bravamente todas as curvas.

Quando passamos dos famosos caracóis, encontramos mais algumas centenas de metros que precisavam ser enfrentados, a 20km/h subimos a quase 4000m de altitude. Resumindo, com todo o esforço do carro nesse trecho, o meio tanque foi para a marca da reserva rapidinho. Sem problemas, estamos a 70km da cidade e o gps marca um posto daqui a 10km. Bom, o posto de fato existia, assim, no passado. Passamos por um complexo quase que todo abandonado, os hotéis fechados, ninguém na rua e o posto fechado a tanto tempo que ninguém lembrava quando ele funcionou pela última vez.

De fato chegamos na reserva, 5 litros que fazem 50km, faltavam 60km para a cidade. Recebemos a dica bem certa, só vai ter descida, põe no ponto morto que você chega. Pronto, seguimos as recomendações e no ponto chegamos em um posto policial, perguntamos quanto faltava para um posto (só para confirmar) e ele falou o que o gps marcava 53km. Até que o policiais olharam para a gente e falaram "vai no ponto morto" (falaram em espanhol, claro). Descida, depois de descida e mais um pouco de descida. Chegamos na cidade com gasolina o suficiente para tentar achar o posto mais barato e encher o tanque.

Ufa!

Continuamos viagem na esperança de encontrar um posto barato, o sul da Argentina tem gasolina por A$10 e na região de Mendoza você não encontra por menos de A$15. Tivemos que nos adaptar aos novos valores, até que o gps nos passou a perna mais uma vez. Em um dia de ficar na estrada, aqueles dias super cansativos que você fica 8h dirigindo, o ponteiro ameaçou baixar do meio tanque mais uma vez. O posto que estava mapeado pelo caminho estava fechado para reforma, 70km até uma suposta cidade, 110km até uma cidade de fato.

Nada disso seria problema se para chegar na cidade mais uma serra nos separava. Subida, subida, devagarinho na primeira, segunda marcha. O morro estava da metade quando a Matilda avisou, reserva outra vez. Desta vez não tinha jeito, a primeira atitude? Procurar uma caneta com carga completa e começar a rabiscar NAFTA nas folhas do caderno.

A cada quilômetro vencido, reduzia o espaço que teríamos que percorrer de bicicleta atrás de mais gasolina. Até que a serra acabou e faltando 30km para a suposta "cidade" marcada pelas placas e pelo gps, voltamos ao truque da banguela. A alegria de poder vencer cada quilômetro e só pensando em como isso de "viver no limite do tanque de combustível" poderia fazer mal para o carro. Com fé seguimos e vencemos todos os quilômetros que nos separavam da tal cidade. Quando chegamos a surpresa, era apenas um paradouro. Tinha lanchonete e tinha gasolina (direto do carro do dono).

Como não aprendemos com tantas lições, e o preço tava um pouco fora do orçamento, pegamos o suficiente para chegar no posto que estava 46km dali. Chegamos no posto, abastecemos um pouco. Andamos mais um pouco, até o centro da cidade e abastecemos todo o tanque, mais o galão reserva. Esse dia foi um dos mais difíceis, além de passar por todo o problema de mais um dia na banguela, tivemos que sair da rota para o norte e nos vimos no meio de San Juan, muito mais perto de Córdoba do que o desejado.

Tentamos um camping fechado, mas a mulher achou melhor não abrir exceção para a gente. Continuamos na estrada até escurecer, mais 200km pela frente. Quase chegamos nos 500km rodados, mas faltaram dois. Um posto de gasolina ao lado de um posto policial parecia (e foi) o lugar perfeito para a noite. E antes de pegar no sono, na 65ª noite da viagem, parecia que o dia da banguela tinha sido dias atrás.

Nenhum comentário:

Postar um comentário